Confrários!: Neologismo utilizado pelos participantes da Confraria, nascido da junção das palavras confrades e revolucionários!

domingo, 22 de junho de 2014

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Empinada", de Alexandre Rauh

Foto "Serra Azul", de Tadeu Fessel.

EMPINADA

A serra não esconde suas curvas.
Sem vergonha exibe sua exuberância.                                 
Sua silhueta contrasta com o céu e linda paisagem enche os olhos.

Após uma descida lá no fundo sobe como montanha russa...
Duas grandes luas, lado a lado, se encontram num beijo...             
Um vale entre as duas, cheio de segredos e surpresas.            
No meio do vale entre as luas uma gruta.
Escondida em silêncio misteriosa.
Uma gruta encantada, penetrar lá é chegar ao paraíso perdido.
A terra prometida de Fawcet.
O éden, de onde não deveríamos ter saído por comer uma maçã. 
É alcançar o nirvana.
É entrar nos jardins de Epicuro.
Após a gruta uma nascente...
Cheia de vida.
Uma pequena relva a cobre, samanbaias com as folhas crespas.
No cume assim e depois a folhagem se escasseia e dá lugar a paredes viscosas
                                                                                                 [que escorrem.
Sempre quente e úmida, delícia de se embrenhar, descobrir, deliciar...
Quando chove escorre mais e mais...
O cheiro de chuva entorpece, emudece.
Suas águas escorrem na serra pelada, entre as luas, no vale...
Ali empinada a serra esconde suas maravilhas,
Empinada desenha no céu sua silhueta e enche os olhos...

Caminhando pela descida profunda encontro as duas luas se beijando e empinada
                                                                        [revela o vale, a gruta, a nascente.


Alexandre Rauh

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Amalgamar", de Alexandre Rauh

Gravura a caneta, de Alexandre Rauh.

AMALGAMAR

Quero me misturar a você.
Como trepadeira, quero me entrelaçar no seu corpo.
Quero meus sentidos todos colados aos seus.
Minha pele roçando na sua.
Meu cheiro misturado ao seu.
O gosto de seu suor e saliva me entorpecendo.
Quero olhar seus olhos e ver mais que o reflexo meu, quero olhar sua alma.
Quero ouvir sua voz sussurrante e seus grunhidos.

Quero minha vara verde sustentando sua flor, 
Regando com vida suas cores,
Levando sabor às suas pétalas,
Perfume ao seu botão.
Quero te segurar em pé e te sustentar.
Te elevar.
Quero te fazer ver pássaros azuis...

Quero tudo. Nossos corpos se fundindo,
Nossos sentidos a mercê,
Nossa mente expandindo.
Quero amalgamar você.


Alexandre Rauh

Semana dos Poetas Contemporâneos: Alexandre Rauh

Foto: Sheila de Paula





Semana dos Poetas Contemporâneos: "Homem Urbano", de Alexandre Rauh

Gravura em Grafite, de Alexandre Rauh.


HOMEM URBANO

Cercado de cima a baixo,
De lado a lado,
Vivo preso entre um encaixo.

Povoações de concreto -
Armado!
Esqueleto decrepto.

Tanta gente vai e volta.
Me sinto, a escoria
De um mundo mudo sem revolta.

Vem e vai. Some!
Uma coisa simplória:
De ouvidos tenho fome.

Me sinto sozinho.
Quero dizer. Pena!
Ninguém quer escutar.
Para que tanta cera?!...
Deviam me deixar só.
E não mais voltar!
De uma só vez!
Para do medo-solidão não restar pó.

De que adianta pesar,
Viverem comigo...
E não me notar?!

Me olham tão frio,
Sobre olhos em redes:
Num semblante perigo.
Estou falando com as paredes?!


Alexandre Rauh

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Cálice", de Alexandre Rauh

Gravura em grafite, de Alexandre Rauh.


CÁLICE

O cálice não me oprime.
Meio cheio ou meio vazio,
Não é ele, sou eu quem digo.
Liberdade é não ser unânime.


Alexandre Rauh

Semana dos Poetas Contemporâneos: Alexandre Rauh

Foto: Sheila de Paula





Semana dos Poetas Contemporâneos: "Deixa Passar", de Alexandre Rauh

Foto: Alexandre Rauh


DEIXA PASSAR

O Crioulo na beira do Rio Garças
Deixa passar o Rio, deixa passar as águas...
O Rio não é mais o mesmo, o Crioulo não é.
Voa no ar a garça, no ar e água ia o boto, ronca a dor interior...
Frente ao Rio a paz, o cantar das águas, o azul do céu...
Volto os olhos à cidade, verde, cinza, zunido, balburdia, fumaça e correria.
Respiro e lembro o Crioulo, olho a vida como quem olha o Rio. Deixa passar.


Alexandre Rauh

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Liberte-se do Medo", de Alexandre Rauh

Gravura em Grafite, de Alexandre Rauh.

LIBERTE-SE DO MEDO!

Nossa prisão da alma, da imaginação, do prazer, do coração...
Nossas crenças, nossa fé, nossa moral, nossa herança de sobrevivência...
Nossa obsessão pelo futuro, nossa resignação diante do passado.

A crença, o capital, a herança nos condicionam a agir sob o medo!
Sob o medo – não amamos com liberdade!
Sob o medo – não sentimos com coração!
Sob o medo – não agimos por nós mesmos!
Liberte-se do medo! Liberte-se!
Liberdade de sentir, amar sem correntes, decidir sem culpa!
Olhe o mundo sem o tapa olhos do medo!


Alexandre Rauh

Semana dos Poetas Contemporâneos: Alexandre Rauh

Foto: Sheila de Paula





Semana dos Poetas Contemporâneos: "Há um Deus em Nós", de Alexandre Rauh


Foto: Sheila de Paula


HÁ UM DEUS EM NÓS

Colocamos para fora o deus que criamos, em muitos tempos, muitos lugares.
A fé que nasce em nós a transferimos para relíquias inalcançáveis.
A maior crença nasce dentro do coração.
Com amor podemos fazer de nossas vidas o paraíso, que colocamos atrás
                                                               [de um muro onde não se pode ver.
Tudo criamos. O maior Criador faz morada em nossa alma.
Há um Deus em nós.


Alexandre Rauh

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Prisma", de Alexandre Rauh




Foto: Sheila de Paula


PRISMA

Olhar o mundo com olhos que transformam.
De uma cor só vários sentimentos.
Ultrapassar a fronteira do bem e mal, certo e errado, feio e bonito.
Poamar é mais do que dois lados, mais do que dicotomia.
O amor é onde se encontram nossos lados...
Um prisma em nossa lente da alma...
A poesia se transforma à luz dos nossos olhos.


Alexandre Rauh

Semana dos Poetas Contemporâneos: Alexandre Rauh

Foto: Sheila de Paula





Semana dos Poetas Contemporâneos: "Ouço a Voz do Coração", de Alexandre Rauh

Foto: Alexandre Rauh

OUÇO A VOZ DO CORAÇÃO


Silêncio...             ,
          ...                 !
         ,         ,         ,       .
               ?               ...
           -          -         !!!
            ,                   ...

O que ouvimos quando escutamos somente a nós,
nos diz algo...  Escutemos!
Coragem, medo, ilusões, uma gama de emoções.
O que ouve? Toma consciência...
O Universo – em nós – tem muito a nos dizer!!!
Inpire-se, deixe-se poamar...


Alexandre Rauh



Semana dos Poetas Contemporâneos: "Morte Junto", de Alexandre Rauh

Gravura em grafite, de Alexandre Rauh.

MORTE JUNTO

Você moribundo,
Que despreza o prazer da vida,
E não sabe o porquê de sua ida,
Deve estar longe desse mundo.

Quem te espera não são flores.
O que cerca não são mares.
Quando estiver perto de perder os ares,
Estará mergulhado em dores.

Já no tempo de ir embora,
Não adianta prorrogação.
Se é vida o que tens agora,
Cuida ou a perderá meu irmão!

Tal qual a lagarta morre no casulo,
O homem chora a morte do defunto.
A borboleta parte desse mundo fulo,
E o homem nasce da morte junto.


Alexandre Rauh

Semana dos Poetas Contemporâneos: Alexandre Rauh

Foto: Sheila de Paula


Semana dos Poetas Contemporâneos: "Duas", de Alexandre Rauh

"O beijo", de Gustav Klimt - seleção de Alexandre Rauh.


DUAS


Com uma encontro a paz. A outra é Paz.
Uma eu possuo. A outra é Possessão.
Uma eu amo. A outra me faz Amar mais.
Uma me pega. A outra é Pegação.
Uma me dá prazer. A outra é Prazer.
Uma eu desejo. A outra é Desejo.
Com uma me inebrio. A outra é Ébrio.
Com uma minutos. Com a outra Horas.
Uma me dá tesão. A outra é Tesão.
Com uma transo. A outra me Transa.
Com uma explodo num gozo. A outra é Explosão.
As duas me tem.
Com elas me encontro.


Alexandre Rauh

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Vida no Pé", de Alexandre Rauh

Foto: Sheila de Paula


VIDA NO PÉ

No pé de pitanga,
Na sombra da manga,
No agridoce da acerola,
A vida se desenrola.


Alexandre Rauh

Semana dos Poetas Contemporâneos: Alexandre Rauh


Foto: Sheila de Paula



Semana dos Poetas Contemporâneos: "O Homem Nasce ainda por Nascer", de Alexandre Rauh

Foto: Sheila de Paula.


O HOMEM NASCE AINDA POR NASCER

O homem nasce ainda por nascer.
A vida nos ensina a vivê-la,
Nossas escolhas e erros a ter experiência.

Como com uma casca,
Caminhamos presos dentro de nós mesmos.
Quebrar a casca, romper as amarras,
Nos causa dor e sofrimento.
Mas sofrer é uma escolha quando se aprende a viver.

Estamos por nascer.
Estamos aprendendo.
Estamos caminhando.
Estamos em busca do SER.

Sonhos, desejos, angústias,
Ansiedades, sentimentos que causam as fissuras em nossa casca.
Romper! Partir! Escapar! Permita-se viver!

Ontem nos faz quem somos, mas não pode não nos deixar mudar.
Amanhã é nosso caminho, mas o destino não limita nossa existência. 
Hoje! Agora! Carpe dien! Goze!

Não há tempo para lamentar.
Não há espaço para encostar. 
Há um universo dentro de nós, ainda por descobrir. 
Quanta viagem rumo ao desconhecido podemos fazer mergulhando para dentro. 
Sejamos descobridores de nossa existência.  É a maior conquista!

Nossa casca a nós não se mostra. 
Esconde-se, disfarça-se em nossas crenças.
Não acreditemos! Duvide! Questione!
Mudar o mundo começa em nosso universo!
Há uma longa estrada desconhecida esperando que demos o primeiro passo!


Alexandre Rauh

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Linda Minha Vida", de Alexandre Rauh

Foto: Sheila de Paula.


LINDA MINHA VIDA

Nossas escolhas nos fazem quem somos.
Os caminhos em que deixamos nossas marcas nos mostram de onde viemos.
Nossos olhos revelam o quanto já sentimos,
Quanto nossa alma inspirou.

Não, não somos frutos do destino.
Somos nossas escolhas.
Somos nossas pegadas.
 Somos nossos olhares.

Escolhi amar uma MULHER. 
Minhas escolhas me levaram a ELA.
Meu caminho me trouxe até aqui: ao SEU lado.
Meus olhos me mostraram o mundo e brilhando na multidão A encontrei.

Incrível aprender a AMAR.
Sublime deixar-se PERCEBER. 
Libertador se ENTREGAR.
Sou GRATO às escolhas, passos, olhares, que me fizeram hoje. 
Para AMAR-VIVER-DOAR.


Alexandre Rauh

Semana dos Poetas Contemporâneos: Apresentação de Alexandre Rauh



APRESENTAÇÃO 


Alexandre Rauh. Da juventude a quase maturidade... quando mais moço um amigo dizia “quero ver quando vocês tiveram uns quarenta anos”, referindo-se a mim e a minha companheira Sheila de Paula. Hoje vivo um momento sem precedentes e com certeza definidor do meu futuro.  Vivo o hoje e agora, admirando cada momento, consciente da finitude da vida e do quanto mudando a mim mesmo contribuo para mudar o mundo. “Seja você a mudança que quer ver no mundo”, disse Mahatma Ghandi. Isso trago todo dia em família, no trabalho e com os amigos. Não quero ensinar ninguém, somente levar sentimentos bons e espalhar amor. Como disse o Che “O verdadeiro revolucionário é movido por grandes sentimentos de amor”.

Semana dos Poetas Contemporâneos: Alexandre Rauh

SEMANA DOS POETAS CONTEMPORÂNEOS
Confraria dos Poetas

Alexandre Rauh

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sexta-feira, 20 de junho de 2014

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Miserê", de Benito Vasques

Seleção de Benito Vasques



MISERÊ

Saciar o pensamento
por vezes nos causa tormento:
Queremos trocentas idéias bonitas
e ganhamos umas mil malditas.
Perdemos o sono procurando consolo
levando de tolo um vazio varíolo.
Nos olhos crepitam o arder da manhã,
no café bolachas ao invés de maçã.
Pensamento sadio parece Saci,
ninguém nunca viu mas há de existir.

Benito Vasques

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Gesto", de Benito Vasques

Seleção de Benito Vasques


GESTO

Quanto de interessante
pode haver naquilo que é artificial?
Se este resulta de um movimento articulado
por um gosto não gostado.
Quando apanhada a rosa morta,
deitada no vaso de enfeite,
fizeste um ato de bondade
sem que disso soubesses ser favor.
Aberta tais pétalas em extensão,
avançaram elas o diâmetro das cores
suscitando o desejo de parar.
Mas não houve parada.
Desbotado e com as janelas vazias
não poderias dali extrair a produção preferida.
Serás adubo, tu e ela, dos tratados húmus,
sólidos, cada vez menos.

De que lhe faria rosa
quando bela se está morta?
De que lhe serei observador
quando o crucial está distante?
Se do pólen exala
o perfume do mofo.
Se do molho só retiro
a seiva de um seco fosso.
Se chegando ao núcleo,
cerne e sentido
- o atento catalisador -
encontro-o desfazendo
a palavra em bolor.

Benito Vasques

Semana dos Poetas Contemporâneos: Benito Vasques





Semana dos Poetas Contemporâneos: "Podrer", de Benito Vasques

Seleção de Benito Vasques


PODRER

Podres,
Todos os humanos estão podres.
Se existe alguma exceção
Ela também esconde
Sua podridão.

Podres,
São as verdades ditas nos gritos,
Todas podres
Apodrecendo como verdade
Suas palavras de amor.

Podres,
Aqueles amores estão todos podres,
Suas podridões estão no silêncio,
No galanteio, no charme…
… ali estão podres.

Padecem,
De variadas razões
Todas as podridões.
Ou então seriam perfumes
E não desplumes.

Benito Vasques

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Entoando", de Benito Vasques

Foto sem título, de Benito Vasques
ENTOANDO

Sábia Sabiá
passarinho da mata
me mata de saudade.
Teu canto plagiado
num qualquer assovio
toca um trocadilho infeliz,
na boca fria
do desconsolo.

Benito Vasques





Semana dos Poetas Contemporâneos: Benito Vasques






Semana dos Poetas Contemporâneos: "Isolação", de Benito Vasques

Foto "São Paulo", de Benito Vasques


ISOLAÇÃO

Onde não passa ninguém,
tudo é mais perfeito.
Não sei o que sei sobre isso;
só sei que, onde não passa ninguém,
tudo é mais bonito.
Onde não passa ninguém
há vidas contra o vento.
Onde não passa ninguém,
existe um homem.
E aqueles que não sentem
e desdenham seus prejuízos.

Benito Vasques


Semana dos Poetas Contemporâneos: "Mensagem de Amanhã", de Benito Vasques

"O Escolar", de Vincent Van Gogh

MENSAGEM DE AMANHÃ
Homenagem de um ex-aluno à escola e ao poeta que o ensinou a ler a tudo.

Quando eu crescer,
depois de brincar
uma tarde inteira
e manhosamente
chorar soluçando,
vou te ler um poema.

 Quando eu ficar grande,
correndo uma maratona
de vitórias contra os tombos,
escalando os muros em
montanhas perigosas,
vou te falar da saudade.

Quando eu clamar independência,
Após pedir socorro em rios
menores que o Ipiranga
e chamar pelo colo mais que seguro
do amor,
vou te pedir um abraço.

 E quando eu terminar o colégio,
sem terminar nunca o caminho
do aprendizado,
vou olhar para trás.

 E lá, nas mensagens de ontem,
eu vou te perceber no amanhã,
e no amanhã que chega sempre
no dia seguinte te enviarei
uma outra mensagem,
aquela que fica, não parte,
não cresce, não some,
pois ficando criança
será da confiança
do meu coração.

Benito Vasques



Semana dos Poetas Contemporâneos: Benito Vasques





Semana dos Poetas Contemporâneos: "Músculos", de Benito Vasques

Foto de Auguste Rodin e sua obra "O Pensador"



MÚSCULOS

Mínguas na procura ébria
a sutura reta de colossos,
sânscritos postos orgânicos, fossos:
Um bendito súdito clássico
e suntuoso.

Cavalgas de pé o maravilhoso terreno
o qual julgas sortido e sedoso,
Tudo proscrito no manual grego
emaranhado em nó formoso.

Assentado na pedra só calcário e osso,
flâmulas carnes de intestino grosso,
perfumo meu universo com desejos
de amores conjugados e soltos.

Meu braço incalcula
o peso do sonho,
Não tenho in natura
o desenho dum tronco.

Desprezo querendo teu olhar mundano
sendo um póstumo traço de corcel orgulhoso,
pavilho a paisagem dos que não tem rosto.

Benito Vasques.

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Nefertiti", de Benito Vasques

Seleção de Benito Vasques


NEFERTITI

Sei de um começo de trilha que não me leva daqui,
sei de um caminho de lava que não me espanta por ir.
Se piso não arde, se passo não dói.
Sei que sacoleja, aturde.
Mas me flana nos ombros um vôo de asas vermelhas,
de canto afinado,
de pouso sublime.
Sei de um início de sempre porvir,
num refúgio deserto,
numa trama em Armana.
Sei de uma entrada de vinda
que no granular de uma ampulheta
desfaz-te assim.
Sei de desejos, de devaneios
sem coroas azuis e tampouco com plumas
do anseio por ti.
Fugidas de Tebas, sumidas em si,
sei que te conheço no recesso de mim.

Benito Vasques


Semana dos Poetas Contemporâneos: Benito Vasques





Semana dos Poetas Contemporâneos: "A indigestão do Acaso", de Benito Vasques

Seleção de Benito Vasques


A INDIGESTÃO DO ACASO

Sempre se é afetado no caso,
Nesse acaso sorteado no susto,
Assustando os mais vagos atos,
Na nauseada consciência do fato.

 Mambembe verdade de um segundo,
Só ali se faz viva e grata,
Ausente da sua relação com o mundo,
Na própria criação ela se mata.

É indigesta à aspiração
O inesperado acontecido mais rápido.
Não se pode encontrar um único passo
Que não seja contrário a mais pura ação

Benito Vasques


Semana dos Poetas Contemporâneos: "Matarão", de Benito Vasques

Seleção de Benito Vasques


MATARÃO

Matarão a jaguatirica
e a cotia da Serra do Mar.
Irão subir soldados em tropas
de aço a bufar o denso ar da evolução.
Matarão sem culpa de fazer,
precisarão se culpa só para descerem
os morros de neblinas encharcadas,
onde antes um bandeirante eu vi nascer.
Matarão aquele tempo descoberto
em um sol de tantos outros tempos
vindos do longo sereno de um projeto.
Matarão a vida das moças dançantes,
que dançam com as flores,
com seus precoces maridos e amantes.
Matarão o homem desse mato,
matuto e barato nas mãos
dos outros homens de aço.
Matarão inclusive as trilhas
que os fizeram chegar
Matando também as lembranças
que nos fazem voar.
Matarão sem maldade!
Matarão sem vontade!
Matarão a dor na saudade
desse paredão encravado,
onde um inglês já morou
e foi matado
pela maravilhosa mudança da estação.

Benito Vasques

Semana dos Poetas Contemporâneos: Benito Vasques






Semana dos Poetas Contemporâneos: "Periferia do Âmago", de Benito Vasques

Seleção de Benito Vasques


PERIFERIA DO ÂMAGO

Machucar uma fruta não parece
desafio tortuoso a nenhuma
mão afeita à violência gratuita
duma prece.
Não desaparecem as cores,
a terra, a fertilidade, os insetos.
Declara-se morta a ciência e
iniciada uma fortuita guerra:
Embatem a marcha desértica
da vida sem sereno e milhões
de xucras almas penadas
esperando por letras proféticas.
Tilintando espadas e copos,
banquete farto de tragédias, não
ouve-se ao fundo de cada passo
energúmeno a voz sufocada do
coração alcagüete.

Benito Vasques

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Bom Olhado", de Benito Vasques

Seleção Foto: Benito Vasques



BOM OLHADO

Não quero fazer idéia
de quão rápida é a mensagem
realizada por fotografias coloridas.
Eu não tenho estúdio escuro,
véu vermelho e tampouco as lentes
necessárias que me dariam cometas.
Ainda disponho tão somente de
um punhado mísero de grafite
(o incapaz diamante) e um
peito aberto de retalhos
almofadados e salinos.

Benito Vasques

Semana dos Poetas Contemporâneos: Benito Vasques






Semana dos Poetas Contemporâneos: "Bilhete de Resposta", de Benito Vasques

Seleção de Benito Vasques


BILHETE DE RESPOSTA

Sem sucesso esgrimi o barroco das minhas frases,
nada vasculhei em meu recado que não fossem saudades,
fiz do querer sintonia fina com o viver de minhas vontades
e lancei aos marulhos de outrora as mais presentes verdades.

Embora vistoso, foi meu aceno um disparate misterioso.
Provocou nada mais que interjeições de tom duvidoso,
fez escapar dos mais conhecidos agrados o proveitoso
e indiferente desmerecimento do amor suspiroso.

Respondo e devolvo a indagação novamente
com a mesma austeridade e doçura em mente.
Permaneço em assovio distraidamente,
cético um pouco com a manifestação de quem mente.

Benito Vasques

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Analógico", de Benito Vasques



Seleção da Foto: Benito Vasques


ANALÓGICO

Das novidades
um velho sorriso
guarda deselegância no ângulo,
aproximando sem jeito
suas extremidades.

Em horizonte,
a harmonia do êxtase,
o fôlego e a alegria
parecem certos na tônica,
mas falsos na canção.

É tensa a melodia
do embate tecnológico.

Do corpo daquilo morto
a expiração fotografada
de um beijo cerimonial.

O vigor das bocas
naquilo que automatiza
o desafio.

Mal diria um ditado
se calasse a pronúncia,
se toda sorte que se faz dita
fosse o eco da vingança.

Esconde-se o amor na palavra digital!

Benito Vasques

Semana dos Poetas Contemporâneos: Apresentação de Benito Vasques



APRESENTAÇÃO

Procuro concertos, na metade estimada da vida, espetáculos são aquilo que de maior sentido se pode ter. Escrevo em arritmias, em apneias, em soluços, penso que para isso não possuo conserto, mas também nem procuro. E apesar de tanto tapa na cara e chute no vácuo, teimo em ser um apaixonado.

Benito Vasques

Semana dos Poetas Contemporâneos: Benito Vasques

SEMANA DOS POETAS CONTEMPORÂNEOS
Confraria dos Poetas

Valter Ramos Jacinto

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quinta-feira, 19 de junho de 2014

Semana dos Poetas Contemporâneos: Foto "Soldados Soviéticos em Berlim", 1945 - de Yevgeny Khaldei

 Foto "Soldados Soviéticos em Berlim", 1945 - de Yevgeny Khaldei
Seleção de Valter Ramos Jacinto

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Desagravo aos Filhos da Pátria", de Valter Ramos Jacinto

DESAGRAVO AOS FILHOS DA PÁTRIA!

Eis o país do futuro
De joelhos a caminho do infortúnio
Não sem luta
Pois, de tal forma, nada muda!

“Tá lá um corpo estendido no chão”
Juntamente com ele, outros estarão
Desfaçamo-no logo desse fardo
Bem passadas fardas subjugadas ao Capital

Pelo bem da mãe-pátria
Pela impunidade costumeira
Ocultemos corpos e interesses
À História?
Rasguemo-la algumas páginas!

Os vermelhos crescerão, mas desapareceremos
Cumprimos nossa obrigação com a pátria
A pátria imperialista de tio Sam
Afinal, a quem mais devemos satisfação?

Sendo pelo bem da nação
E para felicidade geral do Capital
Onde reside o mal?

Atendamos a pequena burguesia
Também a classe média
Ocultemos o mal
Que o não virar de página nos reserva

Às favas com a Comissão da Verdade
Que punam os pobres de sempre
Aos poderosos o povo reserva:
Vão à merda, burgueses filhos da pátria!

Valter Ramos Jacinto

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Meu Mundo Não é Desse Reino", de Valter Ramos Jacinto

MEU MUNDO NÃO É DESSE REINO

Serás salvo se aceitar meu Deus!
Deus me livre de aceitar seu Deus!
Céu, Inferno e Purgatório
Adquira seus genéricos

Não há salvação dentro de qualquer igreja
Ser salvo é preciso
Salvar-se é desnecessário
Nascemos e sofremos purificados

Mil serão enganados ao teu lado
Dez mil devotos representarão a anacrônica direita
Mas a alienação religiosa não chegará a ti
Graças a Kratos!

Valter Ramos Jacinto

Semana dos Poetas Contemporâneos: Valter Ramos Jacinto


Semana dos Poetas Contemporâneos: Tela "Operários", 1933 - Tarsila do Amaral

Tela "Operários", 1933 - Tarsila do Amaral
Seleção de Valter Ramos Jacinto

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Mundos e Fundos", de Valter Ramos Jacinto

MUNDOS E FUNDOS 

Hoje acreditei novamente
Inocentemente acreditei
O resultado não foi diferente
Quase abandonei

Errar e viver dessa forma
Nietzche alertou que é humano,
Demasiado humano!
E isso, por comum que seja, apavora

Pertencendo a esse louco mundo
Mundo do desastre e da alegria humana
Percebo minha vontade mundana

E ao me isolar em meu âmago,
Procurando e achando cada vez mais fundo
Que meu destino seja uma cabana
E que nela caiba todo o mundo

Valter Ramos Jacinto

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Minha Prisão", de Valter Ramos Jacinto

MINHA PRISÃO
 
Hoje percebo boquiaberto
Que a cada instante fico mais perto
Daquele desejo de me libertar
Quem sabe até despertar?
 
Mas quanto mais me liberto
Mais vontade tenho de fixar xilindró
Menos cativo me percebo
Lembrança suave dos conselhos da vovó
 
Ah, meu santo desespero!
Assim, destempero!
Rumo ao desconhecido
Estranho conhecido
 
Pessoa afirmou:
Navegar é preciso, amar não é preciso!
Assim segue a dúvida:
Do que preciso?
 
A precisão matemática
Foge a meu gosto humanista
Recorro à retórica
Sem aquela paciência intimista
 
Nessa minha prisão inglória
Da qual me tornei insurgente
Nem a essa prisão sinto-me pertencente
Nem a minha própria história
 
Valter Ramos Jacinto 

Semana dos Poetas Contemporâneos: Valter Ramos Jacinto


Semana dos Poetas Contemporâneos: Pintura "Escola de Atenas",1510 - de Rafael Sanzio

"Escola de Atenas",1510  - de Rafael Sanzio
Seleção de Valter Ramos Jacinto

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Mestres e Discípulos, Vice Versa", de Valter Ramos Jacinto

MESTRE E DISCÍPULOS, VICE E VERSA

O mestre e filósofo afirmou:
Só sei que nada sei
Mas no fundo muito ele sabia

Ao assumir sua condição humana precária
Sua santa ignorância diária
Deu a maior lição de todas
Humildade no trato com seus irmãos

Aluno, professor, educando, educador
A diferença entre eles
Não deve gerar desigualdade e dor

Educação é amar livremente o saber
Sigo aprendendo a ser feliz
A cada “bom dia, professor!”
Aos meus queridos alunos digo:
Sou-lhes grato por me permitirem ser
Eu mesmo!

Valter Ramos Jacinto 

Semana dos Poetas Contemporâneos: "Páscoa", de Valter Ramos Jacinto

PÁSCOA

Diante do desconhecido
Procuro algo que reconheça
Nada me é familiar
Dejavù

Navegar é preciso?
Renascer é necessário
Mudar o mundo requer
Coragem e vida extra!

Recolhendo-me
A minha miúdez
Religando meu ser ao Seu
Tornando-me vivo outra vez!

Valter Ramos Jacinto

Semana dos Poetas Contemporâneos: Valter Ramos Jacinto

Valter Ramos Jacinto com irmão Paulo Ramos Jacinto